24/04/2024

Veto a sustentações orais abre conflito entre o Supremo e a advocacia

Por: Rafa Santos
Fonte: Consultor Jurídico
A temperatura do debate entre o Supremo Tribunal Federal e a Ordem dos
Advogados do Brasil subiu nas últimas semanas. E ela atingiu o ponto mais alto
quando, em um julgamento da 1ª Turma da corte, foi negada pelo ministro
Alexandre de Moraes uma sustentação oral em agravo regimental solicitada pelo
criminalista Alberto Toron.
De modo cortês, o advogado manifestou sua contrariedade com a atitude do
magistrado: “Respeito o entendimento de Vossa Excelência, de seus eminentes
pares, e nós sabemos que o regimento interno deste egrégio Supremo Tribunal
Federal veda sustentações orais em agravos regimentais. Porém, a Lei 14.365
expressamente regulou a matéria de forma diferente. Ambas as leis tratam do
mesmíssimo assunto, só que uma é posterior à outra. E esse critério da
cronologia deveria prevalecer”.
Na tréplica, o ministro disse que o regimento interno da corte prevalece sobre
a lei e reafirmou que não há sustentação oral em agravo regimental, após
consultar rapidamente os outros integrantes da 1ª Turma. Toron aceitou a
decisão, mas fez a ressalva de que apenas ouvindo outras vozes a corte se eleva.
Em resposta ao incidente entre Toron e Alexandre, o presidente do Conselho
Federal da OAB (CFOAB), Beto Simonetti, disse que a entidade já começou
a preparar uma proposta de emenda constitucional para garantir o direito dos
advogados de fazer a sustentação oral em qualquer situação.
“Apresentaremos uma PEC para que acabe a discussão se o que vale mais é o
regimento de um tribunal ou o Estatuto da Advocacia, que é regido por uma lei
federal, e é onde estão descritos todos os nossos direitos. O direito de que nós
possamos, da tribuna sagrada, representar o povo brasileiro, retirando suas
angústias, desfazendo as injustiças perpetradas contra o cidadão do Brasil.”
Por meio de nota enviada à revista eletrônica Consultor Jurídico, Simonetti
lembrou que o CFOAB vem manifestando sua procupação com o assunto
desde que o STF decidiu pautar para o Plenário Virtual as ações relacionadas
aos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023.
“A OAB está em busca de garantir um direito que é da advocacia e da cidadania,
mantendo nosso respeito pelo STF e pelo uso das vias institucionais. A OAB é
legítima para propor esse debate sobre uma PEC para assegurar as sustentações
orais e prerrogativas da advocacia. Tentamos o diálogo desde o início da gestão,
em 2022, mas isso tem se mostrado insuficiente. Por isso nós vamos buscar
esclarecer a questão através de uma PEC.”
A presidente da seccional paulista da OAB, Patrícia Vanzolini, reforça o
discurso de Simonetti. Ela destaca que o Estatuto da Advocacia foi alterado em
2022 para garantir especificamente o direito à sustentação oral em agravo tirado
de decisão monocrática, e que, quase dois anos depois, essa determinação legal
continua sendo descumprida.
“Embora não seja desejada a contraposição entre poderes da República, a
verdade é que era necessária uma medida prática para assegurar a participação
da advocacia, que vocaliza a voz da cidadania. Nessa linha, a título de exemplo,
a OAB-SP apresentou projeto de lei (PL 4.359) que insere no rol das nulidades
previstas no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal o ato
realizado com desrespeito às prerrogativas profissionais”, afirmou Patrícia.
Sem surpresa
A norma que barra as sustentações consta no artigo 131, parágrafo 2, do
regimento interno do Supremo. De acordo com o trecho, “não haverá
sustentação oral nos julgamentos de agravo, embargos declaratórios, arguição
de suspeição e medida cautelar”.
Segundo ministros do STF consultados pela ConJur, como o regimento interno
da corte tem força de lei, a medida vale para o Plenário e para as duas turmas,
ainda que o entendimento já tenha comportado exceções.
No HC 152.676, por exemplo, a 2ª Turma atendeu a um pedido feito por
Toron, admitindo a sustentação oral em agravo interno no caso que levou à
revogação da prisão de Aldemir Bendine, ex-presidente do Banco do Brasil e
da Petrobras. Na ocasião, apenas o ministro Edson Fachin se opôs à fala da
defesa. A decisão é de abril de 2019.
Um ano depois, em sessão encerrada em 30 de abril de 2020, o Plenário do STF
apreciou o mesmo tema no HC 164.593 e decidiu de forma inversa.
Na ocasião, a corte firmou que, no âmbito da jurisdição do Supremo, “não cabe
sustentação oral em agravo regimental de decisão monocrática proferida por
relator em sede de HC”.
De acordo com ministros, levando em conta tanto a definição do tema no
julgamento do Habeas Corpus quanto a regra prevista no regimento interno,
não seria possível alegar surpresa quanto à vedação de sustentações orais em
agravos, ainda que eles entendam o pleito da advocacia.
“Além disso, o monocratismo exacerbado dos tribunais não pode servir,
principalmente em matéria penal, de empecilho para o advogado apresentar os
argumentos oralmente da tribuna. A controvérsia pede uma sincera reflexão:
Justiça célere a qualquer preço ou qualidade das decisões?”.